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O abandono do tratamento para médicos e pacientes

Quando uma pessoa procura um médico e este, após a consulta a aceita como paciente, estabelece-se em geral um contrato de obrigação de meios e não de resultados, uma vez que não se pode garantir o sucesso esperado da intervenção médica ao tratamento solicitado.
A obrigação contratual do médico é a de dedicação, zelo profissional e prudência, e ele se torna responsável pelos prejuízos que forem decorrentes da negligência, da imperícia ou da imprudência, e não pelo resultado de seu trabalho, cabendo ao paciente provar que houve a falha, como regra geral.
No entanto, existem situações em que, tanto o profissional médico como o paciente, abandonam o tratamento, sendo que a omissão do médico será dolosa se for dele o afastamento unilateral. Se o abandono do tratamento for, porém, do paciente, o seu desaparecimento exime de culpa indiscutivelmente o médico pelo que possa ocorrer.
Desta forma, para o paciente, o dever do médico de atendê-lo com todo cuidado e atenção necessária a sua enfermidade, é um direito inafastável. No entanto, a efetividade do tratamento deverá passar necessariamente pela colaboração do próprio paciente. Não são poucos os pacientes que não atentam para as recomendações feitas pelos médicos que, invariavelmente, recebendo-as por escrito, não prestam atenção, omitem algumas porque acham muito difíceis e seguem de maneira equivocada aquelas que acham mais fáceis.
Há ainda aquele paciente que lê a bula do medicamento e considera que a prescrição não está adequada, achando-se suficientemente esclarecido e apto a complementá-la ou alterá-la. Nem se fale daqueles que acreditam que o desaparecimento do sintoma significa necessariamente a cura e promovem por ato próprio a suspensão da medicação que lhe fora prescrita.
Quer se dizer com isso, sob a ótica jurídica, que os direitos individuais dos pacientes e as obrigações dos médicos devem ser respeitados, não se podendo afastar da necessária reciprocidade: a obrigação dos pacientes e o direito do médico. Essa é a regra inserta no Artigo 945 do Código Civil, segundo o qual: “Se a vitima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano."
É dever do médico, neste sentido, informar ao paciente a importância da adesão ao tratamento e dos riscos que ele eventualmente correrá ao persistir de forma desidiosa com esses cuidados. Lembrando que toda informação dada ao paciente deve ser clara, objetiva e passível de comprovação durante a instrução processual. Resulta dai a imprescindibilidade do correto e completo preenchimento do prontuário médico e da utilização do termo de consentimento informado, por exemplo.
Havendo, entretanto, o efetivo abandono do tratamento pela ausência injustificada do paciente, ainda que o médico assistente tenha tido a cautela de efetuar os devidos registros no prontuário médico, recomenda-se o envio de comunicado escrito ao paciente repisando as informações prestadas anteriormente e alertando novamente a respeito dos riscos aos quais está se submetendo.
Esta tese vem a muito sendo defendida pelo LHML Direito Médico, tendo obtido vitória em várias demandas judiciais. Em uma determinada ação judicial em que se discutia o alegado “erro médico”, o Poder Judiciário manifestou-se no sentido de que: “Advindo, o evento danoso físico que se procura ressarcir, de comportamento omissivo do paciente em se submeter à cirurgia corretiva indicada, esta omissão é a que se apresenta como condição adequada responsável pelo resultado.”
Em outra ação judicial também restou reconhecida a tese defensiva sustentada pelo médico. Assim ficou consignado: “Na hipótese dos autos, o conjunto probatório dos autos, notadamente a prova pericial produzida, atestou a regularidade do atendimento prestado à parte autora em razão de lesão exposta na tíbia, com tratamento conservador mediante o uso de tala gessada e acompanhamento da evolução do quadro. Ausência de nexo de causalidade entre o agravamento do quadro da parte autora e os atendimentos prestados pelos demandados, que teve como causa determinante a não observância do paciente quanto às prescrições médicas e o abandono ao tratamento eleito, circunstância que agravou seu quadro, ensejando na necessidade de posterior intervenção cirúrgica realizada em outro nosocômio.”
Pelo que restou anotado, resta ao médico, nos casos concretos, avaliar de forma minudente a postura e as medidas que serão necessárias para melhor proteger-se.

 


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