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Secretário da Saúde de SC reconhece dívida de R$ 1 bilhão e prioriza mão de obra

Há pouco mais de um mês no cargo de secretário estadual de Saúde, Acélio Casagrande (PMDB) reconhece que a dívida da pasta alcança R$ 1 bilhão. Quando assumiu a cadeira por escolha do governador Eduardo Pinho Moreira (PMDB), dia 22 de janeiro, o novo secretário repetia o discurso de que o débito seria menor, a exemplo de gestores que o antecederam.

Agora, Acélio aponta a dívida como real e calcula que cerca de R$ 500 milhões dizem respeito a pendências com fornecedores e prestadores de serviços essenciais à secretaria, que não podem ser interrompidos. O secretário defende como prioridade honrar compromissos de curto prazo com quem fornece medicamentos, insumos, além de empresas terceirizadas e laboratórios com mão de obra e atuação dentro dos hospitais. 

O restante dos valores, diz o secretário, deve ser renegociado em prazos maiores ou até mesmo contestados — a administração entende que parte dos valores devidos é de responsabilidade do Ministério da Saúde ou de municípios. Na prática, a Secretaria da Saúde busca minimizar a fama de má pagadora em relação a débitos recentes, relativos a atividades essenciais, mas não tem perspectiva de zerar a dívida total.

—Estamos priorizando pagamentos para melhorar e garantir o acesso às pessoas— afirma Acélio Casagrande.

Considerando o dinheiro que entra e os custos mensais da pasta, a margem para abater dívidas é mínima: aproximadamente R$ 6 milhões ao mês. Esse valor, conforme o secretário, é o que sobra dos R$ 226 milhões repassados mensalmente pelo Estado, que já tem R$ 118 milhões comprometidos pelo custo da máquina e outros R$ 102 milhões com salários.

—Essa vai ser a margem e a conta para eu pagar o passivo e buscar receita nova.

A secretaria planeja ampliar a sobra em caixa para R$ 20 milhões mensais dentro de dois meses. Como exemplo de economia colocada em prática, Acélio cita a redução de cargos comissionados, que deve poupar R$ 1,6 milhão por mês em salários. A maioria das medidas, no entanto, ainda é projetada para os próximos meses e depende da revisão de valores e contratos.

Renegociação
Grandes fornecedores e laboratórios passaram a ser procurados para renegociar prazos, cronograma de pagamentos e avaliar descontos sobre o que for negociado em 2018. O objetivo é estabelecer reajuste de preços com descontos que considerem novas formas de contratação. A secretaria não sabe dizer a economia a ser gerada a partir das renegociações.

Reestruturação de compras
A área de compras foi juntada à Superintendência de Gestão Administrativa. A nova gestão diz ter feito um mapeamento de cada processo de compra e formado equipe técnica (enfermeiros, farmacêuticos, técnicos dos hospitais) para revisar contratos e firmar preços, o que antes era feito por um núcleo administrativo. Em alguns casos, a comissão vai providenciar mudanças nas especificações de compra para ampliar a concorrência.

Valor contestado
A Secretaria da Saúde não tem definição do valor da dívida a ser contestado, mas o estima em cerca de R$ 200 milhões. Parte desse dinheiro diz respeito a serviços prestados além dos tetos estabelecidos (como número de cirurgias acima do patamar contratado). Para a secretaria, esses valores deveriam ser arcados pela União ou por municípios. 

Migração de pacientes
Uma comissão definida pela nova gestão trabalha no levantamento de pacientes que recebem medicamentos do Estado por imposição judicial e que poderiam ser atendidos por programas do Ministério da Saúde. O entendimento é de que muitos atendem a critérios da União. A estimativa é de que seria possível poupar até R$ 8 milhões ao ano com a migração.

Plano operativo
A secretaria desenvolve um plano operativo para identificar a capacidade instalada dos 12 hospitais e maternidades da administração direta no Estado. A tese é de que, ao contrário dos hospitais filantrópicos, as unidades da administração direta consomem valores significativos e não têm planos definidos de metas, tanto de qualidade como quantitativos. A intenção é, por exemplo, identificar procedimentos de um hospital que podem ser absorvidos por outros. 

Fiscalização das OS
A fiscalização de Organizações Sociais, que costuma ser trimestral, deverá ser mensal. Conforme a secretaria, os editais lançados para a contratação da gestão do Hospital Florianópolis, do Hospital de Araranguá e do Samu já vão definir fiscalização mensal dos contratos. 

Entidades médicas
A secretaria busca a aproximação com entidades médicas para minimizar o impacto financeiro dos medicamentos judicializados. O entendimento é de que, em muitos casos, o médico poderia atender ao paciente com medicamento que a secretaria já compra, mas acaba receitando outra medicação (o que leva o paciente a buscar a medicação judicialmente). Nesse caso, a secretaria busca maior colaboração da classe médica.

Especialista defende cortes em outros setores

A renegociação de dívidas e outras medidas de gestão interna não bastam para deixar as finanças da Saúde em dia, aponta o professor da Univali e mestre em sociologia política, Eduardo Guerini. Ele defende que o Estado promova cortes drásticos em outros setores do governo e direcione os valores à saúde. A desativação de 15 Agências de Desenvolvimento Regional (ADRs), recém-anunciada pelo governador Eduardo Pinho Moreira (PMDB), é citado como um exemplo de economia que poderia ser estendido a todas as ADRs.

—O Estado teria de fazer uma ação administrativa que reduza custos da máquina do governo e repasse para reduzir a dívida bilionária da saúde. Redução de cargos comissionados, extinção de todas as ADRs para gerar uma economia que chegue próximo dos R$ 600 milhões — aponta.

Além de reduzir despesas, Guerini também aponta como necessária uma maior arrecadação de tributos, medida que considera pouco provável por causa da repercussão negativa junto à opinião pública. Ele é crítico à gestão de Raimundo Colombo (PSD) por não ter elevado a arrecadação tributária, a exemplo de outros Estados que aumentaram fatias de IPVA e ICMS, e por não repassar os 14% do orçamento à saúde.

—Temos a deterioração da saúde catarinense por conta desse descalabro: caos fiscal, queda na arrecadação, queda nos repasses e atraso aos fornecedores —critica.

Como fonte alternativa de arrecadação para a saúde, Guerini também cita os recursos a serem emprestados junto ao BNDES através do programa Fundam 2 (Fundo de Apoio aos Municípios). Santa Catarina busca contrair um empréstimo de R$ 723 milhões, que deve ter a maior fatia destinada a obras. Na avaliação do especialista, parte do montante deveria ser direcionada em ações para a saúde.

Dívida ainda é alvo do Tribunal de Contas
A dívida da Secretaria de Estado da Saúde alcança a marca de R$ 1.083. 958.642,18, segundo apontou uma auditoria operacional do Tribunal de Contas do Estado (TCE), iniciada em setembro. O estudo partiu de um pedido do procurador-geral do Ministério Público de Santa Catarina (MPSC), Sandro Neis, com foco no cálculo da dívida e nos fatos geradores da dívida.

A equipe responsável finalizou o primeiro relatório técnico, em que sugeriu ao relator do processo que a realização de audiência com os responsáveis para que se manifestem sobre os apontamentos da auditoria. O relator, conselheiro Adircélio de Morais Ferreira Júnior, autorizou a determinação da audiência no último dia 9. 

O processo ainda está em fase de audiência. Após a manifestação dos responsáveis, a área técnica do tribunal elaborará um novo relatório. Em seguida, o processo segue o trâmite normal, com o relatório do Ministério Público de Contas, relatório e voto do relator e votação em Plenário.


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