Cientistas da Universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos, encontraram uma explicação para o fato de portadores da síndrome de Down apresentarem menos propensão a desenvolver câncer. O estudo, publicado na revista Nature (www.nature.com), mostra que a justificativa pode estar em uma proteína produzida por um gene do cromossomo 21. A descoberta pode ajudar no desenvolvimento de novas terapias para tratar a doença.
O grupo, liderado pelo pesquisador Roger Reeves, estudou camundongos geneticamente modificados com excesso de uma proteína chamada de Ets2. Quanto mais dessa proteína os animais produziam, menores eram as chances de desenvolverem uma forma agressiva de câncer colo-retal.
Uma vez que a Ets2 é produzida por um gene do cromossomo 21, que é triplicado (em vez de duplicado, como ocorre normalmente) em quem tem a síndrome, os portadores de Down parecem mais protegidos do câncer. "Na faculdade de Medicina, em 1953, ensinavam assim: 'ah, aliás, indivíduos com síndrome de Down não desenvolvem câncer'", disse o oncologista Judan Folkman, do Hospital Infantil de Boston, que não está envolvido no estudo.
Por causa das três cópias do cromossomo 21, as pessoas com Down apresentam retardo mental, características físicas similares e uma chance menor de desenvolver doenças como aterosclerose e retinopatia diabética, além do câncer. Até recentemente, a explicação mais comum era de que elas não viviam tempo suficiente para desenvolver esses quadros. Contudo, o avanço da medicina permite que os portadores cheguem a idades avançadas - e sem apresentar mais casos de câncer.
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Folkman descobriu uma proteína, chamada endostatina, que impede a formação de vasos sanguíneos para alimentar o tumor, matando-o. Sua pesquisa lançou toda uma área de tratamento, a inibição de angiogênese.
O oncologista acredita que portadores de Down produzem endostatina extra naturalmente, mas que há outros genes também envolvidos - entre eles, o Ets2. Afinal, o mecanismo biológico básico da inibição de angiogênese pode também explicar a proteção aparente a outras doenças vasculares.
"A síndrome é sempre considerada uma tragédia familiar. Mas, por outro lado, ele traz essa imensa possibilidade clínica", diz. Segundo ele, o estudo do gene - que parece não estar ligado à síndrome diretamente - pode aumentar o conhecimento sobre o câncer.
O especialista David Threadgill, da Universidade da Carolina do Norte, concorda que a descoberta sobre o Ets2 pode ser usada para uma nova família de drogas. Porém, ele alerta que pesquisas ainda precisam ser feitas, já que a mesma proteína parece estar ligada também à metástase, quando o tumor se espalha pelo organismo.
Fonte: Jornal Estado de São Paulo - 03-01-2008