03-01-2008 - O que vem por aí

Cirurgia realizada por robôs, pílula que vale por quatro e eletrocardiograma que tem suas informações transmitidas pela internet ajudam a formar o cenário para uma história de ficção científica, como o clássico do inglês Aldous Huxley (1894 1963), "Admirável Mundo Novo", de 1932. Mas, na verdade, estão prestes a fazer parte da vida de muita gente ainda neste ano.
A Folha consultou especialistas de diversas áreas para selecionar inovações da medicina que devem chegar ao Brasil em 2008, com a promessa de facilitar a vida de pacientes e médicos.
Essas novidades podem, por exemplo, dar diretrizes para melhor tratar um câncer de mama ao apontar o material genético do tumor. Um simulador cirúrgico  para treinamento do médico  diminuirá os riscos de uma cirurgia oftalmológica e lentes implantadas nos olhos poderão corrigir a visão de maneira mais precisa após uma cirurgia de catarata. Mas calma: diferentemente do que mostra o livro de Huxley, a ciência ainda está distante de ditar as regras na sociedade  ainda que se mostre cada vez mais no controle.

A
Alzheimer
A doença atinge pessoas em idade avançada, que, geralmente, devem ingerir vários medicamentos. A ser lançado no primeiro trimestre, um adesivo de rivastigmina trará mais comodidade a esses pacientes. A eficiência é a mesma das cápsulas, já disponíveis no país, e os efeitos colaterais (náuseas, vômitos, perda de apetite etc.) são menores do que os da versão em comprimidos. O produto deve ser trocado só após 24 horas  o que também pode ser um conforto para os cuidadores.

B
Biofiltro
Apesar de não dispensarem o protetor solar convencional, as cápsulas à base de Polypodium leucotomos, substância derivada de uma samambaia tropical, aumentam a resistência da pele contra o sol. Já disponíveis nos EUA e na Europa, têm demonstrado proteger o DNA celular e restaurar as funções das células de defesa da pele. Por isso, podem ajudar no tratamento de melasmas, herpes e, ainda, na prevenção do câncer de pele. Especialistas acreditam que serão comercializadas no Brasil ainda neste ano.

C
Cardiologia
Os aparelhos "dois em um", que reúnem tecnologias até hoje usadas separadamente, são uma tendência mundial. Um exemplo é o aparelho que une a angiografia, que localiza os vasos sangüíneos, com a tomografia computadorizada, que mostra onde está cada órgão. Somados, esses exames aumentam a noção espacial do médico, tornando mais seguros procedimentos como a aplicação de um stent para desobstruir uma artéria.

D
Depressão
A agomelatina deve chegar ao país até o fim do ano trazendo vantagens para quem usa antidepressivos: ela não leva à perda da libido e propicia um sono mais tranqüilo. O remédio, que também é indicado para transtorno bipolar, estimula os receptores da melatonina (hormônio responsável por, entre outras coisas, regular o sono e o humor) e tem sido testado em pessoas com depressão de moderada a grave, com eficácia similar aos de sua classe.

E
Esclerose Múltipla
O primeiro medicamento endovenoso contra esclerose múltipla pode estar disponível neste ano. Para ser aplicado uma vez por mês, o natalizumab é uma alternativa para pacientes que não apresentam boa resposta a outros medicamentos e também para os que têm surtos da doença muito freqüentes ou de forma muito agressiva.

F
Fisioterapia
Imagine uma luva com eletrodos que ajudam quem tem paralisia nas mãos a abrir e fechar os dedos. Ou um macacão que, suspenso sobre uma esteira, permite que paraplégicos simulem uma caminhada. Peças como essas integrarão neste ano programas de reabilitação motora do HC de São Paulo. A novidade permite que os pacientes não "esqueçam" a forma "correta" de se mexerem.

H
Hipertensão e Colesterol
De 50 a cem brasileiros cardiopatas experimentarão, neste ano, a polipílula  um remédio composto por aspirina, dois medicamentos para hipertensão e um para colesterol. É a primeira pílula no mundo a reunir tantos remédios  a meta é reduzir o número de comprimidos para facilitar a adesão ao tratamento. Ao todo, 550 pessoas testarão a polipílula no mundo. O resultado do teste deve sair até o fim do ano. I

I
Internet
Arritmias não têm hora marcada para aparecer e nem sempre esperam o paciente chegar a uma clínica para fazer um exame. Mas novos aparelhos facilitam o registro do problema. O Web Looper, criado pelo HCor (Hospital do Coração, em São Paulo), possui dois fios e um suporte que parece um telefone celular. Com ele, o paciente faz o eletrocardiograma onde estiver e envia o resultado imediatamente para o computador do médico.

J
Junção
Mais um exemplo de união de tecnologias  desta vez, entre a tomografia e a medicina nuclear. Enquanto a primeira identifica problemas anatômicos, a segunda permite observar o funcionamento de um órgão. Um novo aparelho "sobrepõe" esses dois resultados em um só exame, mostrando se um problema anatômico causa alguma alteração funcional. Isso reduz o custo e o tempo necessários para diagnósticos.

L
Lapatinibe
Esse nome deve se tornar bem comum em 2008 entre oncologistas. Trata se de uma nova opção de tratamento para pacientes com câncer de mama em estágio avançado ou em metástase. Previsto para chegar ao país neste semestre, o ditosilato de lapatinibe é indicado para quem deixou de responder ao quimioterápico trastuzumabe. A nova droga não cura, mas prolonga o tempo de vida, em média, em oito meses, segundo o fabricante.

M
Mama
Mais um avanço contra o câncer de mama: já é possível fazer uma avaliação genética do tumor para identificar o melhor tratamento para cada paciente. Isso evita o uso desnecessário da quimioterapia, por exemplo. Os procedimentos com melhores resultados até agora são o Oncotype Dx e o Mammaprint  o segundo deve chegar ao Brasil neste ano. Também está previsto para este ano o desenvolvimento de uma tecnologia nacional do exame  isso poderia diminuir seu preço, que é de cerca de R$ 5.000.

N
Neurologia
Já adotado pelo HC de São Paulo para tratar depressão, o EMTr (aparelho de estimulação magnética transcraniana repetitiva) será usado também no atendimento a pessoas com dores crônicas ou com danos neurológicos, como os causados pelo AVC (acidente vascular cerebral). A idéia é, por meio da emissão de campos magnéticos sobre os neurônios, recuperar a capacidade motora.

O
Oftalmologia
O Instituto da Visão da Unifesp deverá receber em fevereiro um simulador para cirurgias oftalmológicas  o primeiro da América Latina, de acordo com a instituição.
Com o equipamento, que parece um videogame, os especialistas poderão treinar novas técnicas cirúrgicas antes de aplicá las nos pacientes. Isso significa menos riscos para quem tem de passar por uma operação nos olhos.

P
Parkinson
Dois novos medicamentos devem chegar às farmácias brasileiras ainda neste ano para combater a doença de Parkinson. O primeiro é o comprimido de rasagilina, com ação mais potente que outros medicamentos de sua classe e com menos efeitos colaterais  provoca menos distúrbios do sono e não é hipertensivo. O outro é um adesivo de rotigotina  substância inédita no país  com duração de 24 horas e eficácia semelhante à dos medicamentos de sua classe.

Q
Quente e Frio
A teletermografia permite avaliar o funcionamento de certas regiões do corpo por meio do calor que cada área emite. A tecnologia é antiga: era usada nos anos 50 na detecção de nódulos mamários e, nos anos 90, na análise da revascularização do miocárdio após cirurgias cardíacas. A novidade está em sua mais recente aplicação: a partir deste ano, será usada no HC de São Paulo para acompanhar a vascularização após amputações, problemas de irrigação nos pés de quem tem diabetes, além de hemorragias, inflamações e dores em atletas.

R
Robô Cirúrgico
Os robôs também devem chegar aos centros cirúrgicos neste ano. Capazes de filtrar o tremor natural das mãos dos cirurgiões que os comandam e de realizar movimentos muito precisos e suaves, eles são indicados principalmente para cirurgias delicadas, como a de câncer de próstata. Estudos mostram que os pacientes que operaram a próstata com robôs precisam de menos transfusão de sangue e passam um dia a menos internados.

S
Sem Cortes
Com ou sem robôs, as cirurgias devem ficar cada vez menos invasivas. É o caso da nova operação para refluxo gastroesofágico  problema no qual o suco gástrico sobe e atinge a garganta. No método normal, são necessárias cinco incisões abdominais. No novo, um aparelho é introduzido pela garganta (endoscopia) e "grampeia" a transição esofagogástrica. A cirurgia por orifícios naturais é mais segura e sua recuperação, menos dolorosa.

V
Visão Mais Nítida
Uma nova geração de lentes intraoculares, para pessoas que se submeteram à cirurgia de catarata, está para chegar ao mercado. As atuais não corrigem totalmente o astigmatismo e têm imperfeições periféricas  que podem distorcer as imagens. As novas prometem corrigir a deformação, não geram distorções e terão filtros mais desenvolvidos contra raios ultravioleta. Outra novidade são as lentes intraoculares multifocais, que corrigem a visão para perto e para longe.

Z
Zoom
Um novo exame previsto para este ano promete identificar as pessoas com mais tendência ao acúmulo de placas de gordura nas artérias. Trata se de um aparelho que, em vez de um, conta com dois tomógrafos  cada um com 64 detectores. Sozinho, cada tomógrafo localiza placas de gordura já existentes. Acoplados, eles identificam artérias que são aparentemente normais, mas já estão mais espessas, o que facilita o entupimento. Essa é uma possibilidade inédita na cardiologia, que coloca o foco não no tratamento, mas na prevenção das doenças  essa sim a principal tendência quando se fala de saúde.

FONTES: ALFREDO CARLOS BARROS, oncologista do Hospital Sírio Libanês; AURO DEL GIGLIO, coordenador do programa de oncologia do Hospital Israelita Albert Einstein; CARLOS GIL FERREIRA, coordenador de pesquisa do Inca (Instituto Nacional de Câncer); DANIEL LUIZ GIMENES, oncologista clínico do Hospital do Câncer A. C. Camargo; DENISE STEINER, dermatologista responsável pelo departamento de cosmiatria da SBD (Sociedade Brasileira de Dermatologia); GIOVANNI GUIDO CERRI, professor titular de radiologia do Instituto de Radiologia do Hospital das Clínicas da USP (Universidade de São Paulo); HENRIQUE FERRAZ, neurologista e secretário geral da ABN (Academia Brasileira de Neurologia); IBRAIM MASCIARELLI, médico do serviço de diagnóstico do HCor (Hospital do Coração, em São Paulo); JOSÉ CARLOS PACHON MATEOS, diretor do serviço de arritmias do HCor; JOSÉ LUIZ CAPALBO, gerente médico do Hospital Nove de Julho, em São Paulo; LEÔNCIO QUEIROZ NETO, oftalmologista do Instituto Penido Burnier; LINAMARA RIZZO BATTISTELLA, médica fisiatra diretora da Divisão de Medicina de Reabilitação do HC da USP; MARIA FERNANDA MENDES, neurologista; PAULO BERTOLUCCI, neurologista e diretor científico da Abraz (Associação Brasileira de Alzheimer); PAULO CARAMELLI, neurologista da Faculdade de Medicina da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e membro da ABN; OTÁVIO BERWANGER, diretor do instituto de ensino e pesquisa do HCor e membro do comitê diretivo da pesquisa Pill Pilot, que pesquisa a polipílula; RIAD YOUNES, diretor clínico do Hospital Sírio Libanês; RICARDO MORENO, psiquiatra do Instituto de Psiquiatria do HC da USP; RUBENS BELFORT JR., oftalmologista e presidente do Instituto da Visão da Unifesp (Universidade Federal da São Paulo)

Fonte: Folha de São Paulo - 03-01-2008


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