07-02-2008 - CPMF volta à agenda política

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva não escondeu do Congresso que espera uma compensação para a saúde após o fim da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF). Na tradicional mensagem anual a deputados e senadores, Lula disse que aguarda uma saída para a perda do dinheiro da CPMF, tributo que foi derrubado em dezembro pelo Senado.
O presidente condicionou a essa solução o sucesso do "PAC da Saúde", conjunto de medidas que pode destinar R$ 24 bilhões para a área até 2010. "Infelizmente, esse processo foi truncado com a derrubada da CPMF", disse Lula.
A mensagem foi levada ao Congresso pela ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, que representou o governo na primeira sessão solene do parlamento em 2008. O documento foi entregue ao presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), e lido em plenário pelo primeiro-secretário da Câmara, Osmar Serraglio (PMDB-PR). Dilma preferiu não se pronunciar.
Lula enumera na mensagem ações de seu governo nos últimos anos. Cita, entre outras coisas, o crescimento da economia, do emprego, e garante investimentos de R$ 504 bilhões até 2010 por meio do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento). O texto segue o tom otimista dos discursos presidenciais.

Prioridades
Segundo o presidente, três áreas terão atenção "redobrada" em 2008: segurança, educação e saúde. Não por coincidência, são, na avaliação do Palácio do Planalto, os itens mais importantes da agenda eleitoral deste ano. O combate ao crime e à violência, em especial, é um tema sempre presente em campanhas municipais. O governo precisa que o Congresso aprove medidas que integram o Plano Nacional de Segurança com Cidadania, sua principal iniciativa na área.
O texto assinado por Lula é uma formalidade cumprida pelo presidente da República ao Congresso Nacional. Desde o ano passado, o governo já enumerou sua pauta prioritária para 2008. E orientou seus líderes a segui-la neste ano. Lideram a fila a reforma tributária, e as medidas provisórias que tratam da criação da TV pública e do reajuste da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). A primeira MP já tranca a pauta de votações. O governo tem 45 dias para aprová-la na Câmara e no Senado.
A reforma tributária deve ser enviada até o dia 21 de fevereiro ao Congresso. O principal ponto dela diz respeito à criação do IVA Federal, imposto que unificaria PIS, Cofins e Cide Combustível. Para evitar contratempos, o ministro de Relações Institucionais, José Múcio Monteiro, marcou reuniões a partir da semana que vem com líderes de partidos aliados do governo. A idéia é afinar a sintonia em torno da reforma tributária, para que o texto chegue ao Congresso com uma base de apoio relevante, diminuindo os pontos de divergências.

Férias
Em férias no Guarujá, litoral paulista, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva aproveita o fato de estar hospedado em um forte da Marinha para manter o isolamento. Nem a família rompe essa barreira. Ontem, o mais novo dos irmãos dele por parte de pai, Germano Inácio da Silva, tentou, sem sucesso, visitá-lo pela segunda vez no feriado de carnaval. Sem ser recebido, Germano foi provocado pelos repórteres a avaliar o governo e fez críticas à carga tributária. "Todo governo tem seus prós e seus contras. Tiraram a CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira), mas aumentaram o IOF (Imposto sobre Operações Financeiras), que é mais pesado. Não precisa ser político para entender."

STF resiste a cortar gastos
Em meio à discussão sobre cortes de gastos públicos em decorrência da perda da arrecadação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ellen Gracie, afirmou ontem na abertura dos trabalhos do Legislativo que o Orçamento da União destina "apenas 1,72%" dos recursos para o Judiciário. Ao participar da solenidade de início do ano no Congresso, a ministra destacou que a maior parte da fatia destinada aos juízes corresponde à folha de pagamentos e encargos sociais. "É nossa atividade específica, vale dizer, a prestação de serviços de Justiça, que conforma nossos gastos", afirmou.
Na semana passada, Ellen Gracie reuniu representantes de tribunais superiores para discutir uma proposta de cortes no Judiciário como compensação pela redução de R$ 40 bilhões na receita da União provocada com o fim da CPMF, extinta por decisão do Senado. Não houve nenhuma deliberação sobre as áreas do Judiciário que serão atingidas. Os magistrados decidiram aguardar uma estimativa de aumento da arrecadação que deverá ser apresentada na próxima semana pelo senador Francisco Dornelles (PP-RJ).

Investimentos
Na sessão de ontem, na presença do presidente do Congresso, senador Garibaldi Alves (PMDB-RN), e da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, a presidente do STF deixou claro acreditar que não há excesso na aplicação de recursos no Judiciário. "A rubrica de investimentos resume-se, portanto, em boa parte, a necessárias inversões em infra-estrutura de tecnologia - que nos permitirão prestar melhores serviços -, e a raras e pontuais melhorias de instalações físicas", sustentou Ellen Gracie. Em seu discurso, ela também apontou o Judiciário como detentor da "melhor relação custo-benefício no serviço público brasileiro".
Ellen Gracie esteve no Congresso para entregar a mensagem do Judiciário para 2008 e o relatório de atividades do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), órgão que preside, referente a 2007. O documento aponta como principais decisões dos conselheiros o corte de pagamentos irregulares a magistrados e a abertura de processos e afastamento de juízes envolvidos na Operação Hurricane (Furacão), da Polícia Federal (PF). O relatório lista o afastamento de titulares de cartórios que ocupavam interinamente a vaga sem prévio concurso público e proibição de pagamento de auxílio-transporte a desembargadores.
No relatório, a Corregedoria do CNJ aponta um aumento de 36% no número de processos disciplinares contra magistrados com relação aos últimos dois anos. O Conselho recebeu 2.057 pedidos de investigação em 2007. Os dados também revelam uma boa notícia: o número de casos julgados no Judiciário começam a superar o de novos processos, o que na avaliação do CNJ aponta uma tendência de diminuição da herança de anos anteriores.

Garibaldi no ataque
O presidente do Senado, Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN), surpreendeu o Congresso ontem, na sessão de abertura do ano legislativo. Conhecido por ser um político de fala mansa e avesso a polêmicas, Garibaldi fez um discurso duro. Criticou o Executivo e o Judiciário por usurparem o poder de legislar. Não se constrangeu nem mesmo por dividir a mesa com a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ellen Gracie, e com a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff.
"Os representantes eleitos pelo povo estão sendo alijados do processo de elaboração legislativa e de tomada das decisões nacionais", declarou o senador. Ele reclamou da "desconfiança com que os outros poderes tratam o legislativo". Primeiro, queixou-se do excesso de medidas provisórias editadas pelo governo. "Elas amesquinham o parlamento e acuam o Congresso Nacional", disse.
Logo a seguir, voltou o ataque contra a Justiça. "O Poder Judiciário vem agindo como legislador, em decisões aplaudidas pela opinião pública, mas que implicam riscos crescentes para a prática democrática. A pretexto de interpretar a Constituição, os tribunais avocam o poder de substituir o Congresso."
O discurso também teve espaço para críticas ao próprio Congresso. Ele reconheceu que o parlamento não está cumprindo sua missão e deu como exemplo as centenas de vetos presidenciais que estão na fila de votação, alguns há anos. Também considerou um fracasso o fato de o legislativo não ter votado ainda o Orçamento da União para 2008. "Como pode o Congresso reclamar de ser ator só fantasiado de poder decisório se a ficção começa aqui dentro, fingindo o Congresso que o país tem orçamento, quando não é capaz de elaborá-lo?", questionou.

Vetos
O presidente do Senado prometeu colocar em votação os vetos presidenciais e cobrou dos líderes partidários uma solução para o Orçamento. Criticou ainda a relação dos parlamentares como governo, dizendo que os congressistas são obrigados a esmolar a liberação de suas emendas parlamentares. E defendeu mudanças no sistema eleitoral, impedindo a candidatura de políticos envolvidos em casos de corrupção.
"Há grande perplexidade quanto à investidura de alguns, cujos antecedentes e cujas práticas não condizem com a vida honrada e a ação moralmente íntegra da imensa maioria dos parlamentares", disse. O discurso foi feito dias depois da posse de Edinho Lobão (DEM-MA), suplente que assumiu o mandato no Senado acusado de usar laranjas para fugir de dívidas fiscais.

Os representantes eleitos pelo povo estão sendo alijados das decisões nacionais
Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN), presidente do Senado

Fonte: Correio Braziliense - 07-02-2008


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