Cientistas americanos desvendaram uma forma específica pela qual o vírus da imunodeficiência humana (HIV) ataca as células, uma descoberta que abre caminhos para o desenvolvimento de novas terapias contra a aids. Foi identificado um novo receptor humano para o HIV, que ajuda a guiá-lo para o intestino assim que ele entra no organismo, de onde inicia seu ataque incansável ao sistema imune.
As descobertas da equipe chefiada por Anthony Fauci, diretor do Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas dos Estados Unidos, foram relatadas, no domingo, no site da revista Nature Immunology.
Já faz anos que os cientistas sabem que o HIV invade rapidamente os nódulos e tecidos linfáticos, abundantes em todo o intestino. O órgão é o principal ponto de multiplicação do HIV - dali o vírus parte para privar o tecido linfático das células imunes CD4, que seriam fundamentais no contra-ataque ao HIV.
Isso ocorre em todos os indivíduos infectados pela aids, tenham eles contraído o vírus por relação sexual, transfusão de sangue, contaminação por seringas ou agulhas, na passagem pelo canal vaginal no nascimento ou na ingestão de leite materno contaminado.
Agente duplo
"(As descobertas) começam a lançar luz no processo misterioso pelo qual o vírus se desenvolve preferencialmente no intestino", diz Walter Greene, especialista em aids e diretor do Instituto Gladstone de Virologia e Imunologia em São Francisco (que não trabalhou na pesquisa).
Fauci, James Arthos, Claudia Cicala, Elena Martinelli e seus colegas mostraram que uma molécula, a integrin alfa-4 beta-7 - que direciona naturalmente células imunes para o intestino -, é também uma receptora de HIV. Uma proteína no envelope do vírus se prende a uma molécula na célula receptora - ligada especificamente à maneira como as células CD4 se dirigem ao intestino.
A ligação do vírus à molécula integrin alfa-4 beta-7 estimula a ativação de outra molécula, LFA-1, crucial na propagação do vírus de uma célula para outra. As ações acabam levando à destruição do tecido linfático, em especial no intestino.
São conhecidos vários outros receptores do HIV. O mais importante é o CD4 em certas células imunes; seu papel como receptor de HIV foi identificado em 1984. Outros dois receptores importantes, conhecidos como CCR5 e CXCR4, foram identificados em 1996.
O CCR5 é um componente normal em células humanas e age como porta de entrada para o HIV. As pessoas que não o têm, em razão de alguma mutação genética, raramente são infectadas mesmo que fiquem repetidamente expostas ao HIV.
Os cientistas têm procurado identificar receptores porque eles oferecem alvos para o desenvolvimento de novas classes de remédios. No ano passado, as autoridades reguladoras americanas autorizaram um tratamento que bloqueia o CCR5.
Algumas drogas experimentais que neutralizam a molécula receptora integrin alfa-4 beta-7 estão sendo testadas para o tratamento de doenças auto-imunes em geral. Para Fauci, essas drogas deveriam ser estudadas também para a verificação de seu benefício no tratamento específico da aids.
Fonte: Jornal Estado de São Paulo - 12-02-2008