29-02-2008 - RJ: Um hospital que é caso de polícia

A quinta-feira foi de más notícias para o Hospital Estadual Pedro II, em Santa Cruz. A unidade assistiu à morte de uma menina de quatro anos, supostamente causada por um medicamento com a validade vencida, e ao alagamento de uma copa próxima ao Centro de Tratamento de Queimados. Dois setores tiveram suas atividades interrompidas pelo incidente durante a manhã, segundo funcionários ouvidos pelo Jornal do Brasil. Os casos provocaram reação enérgica da Secretaria Estadual de Saúde, que mandou o seu número dois para a Zona Oeste. Não foi o suficiente para conter os ânimos exaltados - a apuração das duas tragédias acabou na delegacia.

Cinco dias de agonia
A menina Jéssica Rocha de Oliveira foi internada com falta de ar sábado. Tomou uma injeção e, logo depois, foi liberada. O que parecia ter sido apenas um susto ganhou desdobramentos inimagináveis para a família. Na manhã de segunda-feira, ela acordou muito vermelha e inchada. No dia anterior, tomara outra dose da injeção que lhe passaram em sua passagem pelo hospital. De volta à unidade, a criança não resistiu a uma crise convulsiva na quarta-feira.
- Prestei queixa na delegacia contra o atendimento que deram à minha filha - revolta-se a mãe de Jéssica, a dona-de-casa Patrícia Rocha. - Ela se esticava toda e mordeu a língua até sangrar. Ninguém me falava sobre o seu estado.
Mesmo sendo portadora de Síndrome de Down, Jéssica, segundo a mãe, tinha uma vida normal. Começaria a estudar em um colégio municipal na segunda-feira que vem - por falta de professores, o ano letivo fora adiado em uma semana.
- Mesmo com a deficiência, ela era muito esperta, andava, brincava, fazia de tudo - lembra a mãe. - Quero saber se foi mesmo a injeção que a matou.

Caso suspeito
A morte de Jéssica provocou uma comoção no hospital. E, na pediatria, uma nova complicação com a polícia. A 36ª DP (Santa Cruz) recebeu ampolas de um medicamento fora do prazo de validade. As injeções foram aplicadas no menino Fábio José Guedes, de apenas 9 meses, internado em estado grave com os mesmos sintomas de Jéssica. O material foi mandado para o Instituto de Criminalística Carlos Éboli (ICCE). A Polícia Civil também fez um exame no corpo da menina para determinar se a sua morte foi ou não provocada por remédios vencidos.
- Levei meu neto ao hospital na sexta-feira, porque ele estava com febre e garganta inflamada - conta a avó do bebê, Solange José Guedes. - No dia seguinte, Fábio estava com os olhos e o pescoço parados. Domingo a enfermeira de um posto de saúde se recusou a lhe aplicar a injeção que nos deram no hospital, porque estava com a validade vencida. Meu neto entrou em sono profundo e só acordou na quarta-feira, todo inchado e sem conseguir se mover. Só depois de procurarmos a polícia o hospital se mobilizou para fazer uma tomografia.
O secretário estadual de Saúde, Sérgio Côrtes, considerou os casos "gravíssimos". Segundo ele, os diretores dos hospitais receberam um comunicado para que mandem à Central Geral do Almoxarifado todos os remédios cuja data de expiração está próxima.
- Não existe lote vencido entre aqueles enviados à rede estadual - garante o secretário. - Mas, infelizmente, o controle centralizado da distribuição é novidade em nosso sistema. Antes, cada hospital comprava à sua maneira. Queremos avaliar se, no estoque do Pedro II, havia algum medicamento vencido.

Farmácia normal
Enviado à unidade para comandar a sindicância, o subsecretário de Atenção à Saúde, Carlos Armando Lopes do Nascimento, negou que os episódios envolvendo as crianças fossem causados por remédios irregulares. Jéssica, de acordo com Carlos Armando, morreu por cardiopatia com insuficiência cardíaca - nada relacionado, portanto, a reações ao medicamento.
Fábio, por sua vez, tem um quadro de doença neurológica crônica e não apresenta quadro clínico de reação a remédios fora da validade. O subsecretário não encontrou medicamentos já inutilizáveis na farmácia do Pedro II.
O corpo de Jéssica já foi liberado pelo Instituto Médico Legal. Seu enterro será realizado esta manhã, em Campo Grande.

Fonte: Jornal do Brasil - 29-02-2008


 


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