23-04-2008 - Campanha contra a Emenda 29

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva colocará amanhã uma faca no pescoço do Congresso. Na reunião do chamado conselho político - onde têm assento os líderes e presidentes dos partidos aliados -, avisará que se os parlamentares quiserem mesmo aprovar a regulamentação da Emenda 29, terão de criar um imposto para financiá-la. Os ministros Guido Mantega (Fazenda), Luiz Marinho (Previdência) e José Gomes Temporão (Saúde) foram recrutados para participar da empreitada. Trarão os argumentos técnicos com os quais Lula afiará sua navalha.
A regulamentação da Emenda 29 é o assunto do momento na Câmara. Elaborado pelo senador Tião Vianna (PT-AC), o projeto de lei complementar 121/07 foi aprovado no último dia 9 no Senado. Ao atravessar o Congresso, ganhou de cara o lobby poderoso da Frente Parlamentar da Saúde, um bloco pluripartidário que se espalha entre governo e oposição e conta inclusive com o apoio do presidente da Casa, o petista Arlindo Chinaglia (SP). Os articuladores do Palácio do Planalto já sabem que dificilmente conseguirão barrá-lo. E, como se trata de uma injeção bilionária no Sistema Único de Saúde, tentam evitar que o presidente o vete em pleno ano eleitoral.
O argumento da equipe econômica é o de que a regulamentação obriga o governo a engessar uma fatia grande, entre R$ 5 bi e R$ 6 bi, dos gastos previstos para este ano. Sem o projeto de Tião Vianna, o dinheiro seria aplicado em outras despesas. Mas se for aprovado, das duas uma: o governo cancela obras ou fabrica dinheiro.
Como não quer macular o seu propagandeado Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) com um corte bilionário de grandes obras públicas, o Palácio do Planalto prefere fabricar dinheiro. Sendo assim, Lula chamou seus três ministros para ajudá-lo a pressionar os deputados a ressuscitarem a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) ou inventarem outro tributo capaz de lhe permitir o que julga ser o melhor dos mundos, isto é, manter o PAC, aumentar os gastos em saúde e ainda botar a culpa da alta de impostos no Congresso Nacional.
No Parlamento, o assunto desperta paixões. Na tarde da última quinta-feira, a tradicional calmaria que toma conta da Câmara foi quebrada por uma passeata liderada pelos deputados Darcísio Perondi (PMDB-RS) e Rita Camata (PMDB-ES). Acompanhados de cerca de 30 outros manifestantes, eles adentraram no Salão Verde, todos vestidos com batas brancas, semelhantes às usadas por médicos. Bradavam palavras de ordem pela saúde pública e exigiam que Chinaglia pautasse rapidamente o projeto de Tião Vianna. Mesmo solidário ao tema, o presidente da Câmara não assumiu nenhum compromisso público. Mas a pressão só cresce.
De antemão, líderes da oposição avisam que não aceitam de forma nenhuma uma subida de impostos neste ano, mesmo que seja para custear melhorias no sistema de saúde. O líder do DEM, Antonio Carlos Magalhães Neto (BA), diz que o governo vem registrando excessos de arrecadação e que pode usá-los. O presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra (PE), já se declarou favorável ao projeto de Tião Vianna. Mas os tucanos também se negam a votar pela recriação da CPMF ou de qualquer outro tributo como fonte de financiamento.

Entenda o caso
Gastos fixados
A Emenda 29 à Constituição Federal, aprovada em 13 de setembro de 2000, estabeleceu que, naquele ano, a União gastasse na área de saúde quantia 5% superior à de 1999. E determinou também que nos anos seguintes o orçamento da saúde crescesse segundo a variação nominal do Produto Interno Bruto (PIB). Aos estados, coube separar 12% das receitas para o setor. A fatia dos municípios ficou em 15%. A regra era transitória, deveria vigorar somente até 2004. Jamais foi regulamentada, porém. Portanto, nunca foi implementada.
No último dia 9, o Senado aprovou projeto de lei complementar com os critérios a serem usados pelos governos federal, estaduais e municipais na elaboração do orçamento da saúde, como manda a Emenda 29. Por ele, a União fica obrigada a orçar seus gastos em saúde de forma crescente, até que o bolo atinja 10% das receitas totais em 2011.
 
Fonte: Correio Braziliense - 23-04-2008


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