23-06-2008 - Jornada discute interferência da justiça na área da saúde

Representantes dos governos municipal e estadual, do Poder Judiciário e de operadoras de saúde debatem com a Federação Nacional dos Médicos (Fenam) e o Sindicato dos Médicos do Pará (Sindmepa) a atuação do sistema judiciário na área da saúde pública e suplementar, durante a V Jornada Médico- Jurídica Fenam/Sindmepa, que se realiza nesta quinta e sexta-feira, 19 e 20/06, na sede do Conselho Regional de Medicina do Pará, em Belém. No centro das discussões está a chamada judicialização da saúde.    
Embora o Brasil tenha um dos melhores sistemas de saúde do mundo, único no planeta a garantir atendimento universal e gratuito para todos os cidadãos, é nítida a má administração e falta dos recursos para garantir a qualidade de atendimento. Logo, a sociedade viu-se obrigada a procurar alternativas para conseguir tratamentos por meio de ações judiciais.     
“Se o sistema de saúde operasse com qualidade, não haveria razão para a interferência da justiça no sentido de obrigar o cumprimento de deveres ratificados pela Constituição Federal”, afirma a promotora de justiça Socorro de Maria dos Santos.    
Por outro lado, como os recursos disponíveis para a saúde são escassos, essa interferência jurídica aumenta o desequilíbrio no atendimento. “Para atendermos às ações judiciais, retiramos de algum setor os recursos para essa ação. E, então, é justo com os outros cidadãos que precisam tanto quanto o requerente da ação. Onde está o senso de coletividade?”, critica a representante da Secretaria Municipal de Saúde de Belém, Graça Sotero.     
Outro aspecto levantado, é o fato de as ações terem se tornado repetitivas. “Em muitos casos, o mesmo indivíduo entra com mais de uma ação. Isso mostra que as pessoas passaram a utilizar a justiça como forma de entrada privilegiada no Sistema Único de Saúde (SUS), passando na frente, inclusive, daqueles que estão na fila para determinados procedimentos”, explica Graça Azevedo.
    
SUS     
Para se entender melhor o contexto do sistema público de saúde, o Brasil investe 10% do Produto Interno Bruto (PIB) no setor. Os valores pagos ao SUS são tabelados e abrangem todos os procedimentos necessários à população. O problema é que, segundo representantes do Sindmepa, não há uma definição clara do que sejam investimentos em saúde; os valores pagos pelo SUS aos prestadores de serviços de saúde são considerados irrisórios. De um lado, a gestão pública afirma que não tem recursos para investir, de outro os prestadores de serviço reclamam que os baixos valores não compensam o trabalho; e no meio, a população, que sofre com o atendimento sem qualidade.
    
Saúde suplementar     
Como a saúde pública apresenta sérios problemas operacionais, a classe média brasileira optou pelos serviços dos planos de saúde. No entanto, ao contratar esses serviços, a pessoa está sujeita às limitações contratuais da respectiva operadora. Muitas dessas limitações ferem o direito dos consumidores, que, ao recorrerem à justiça, são beneficiados com as tutelas antecipadas, obrigando os planos de saúde a cumprirem a decisão judicial em um determinado prazo. Caso contrário, as multas são altíssimas.    
No Tribunal de Justiça do Estado do Pará, atualmente, há centenas de processos contra operadoras de planos de saúde. Para a juíza Luzia do Socorro dos Santos, da Vara de Consumo, se o plano de saúde não tem condições nem de atender de forma decente à clientela existente, ele deve parar de contratar. “Outro dia, tive de determinar a uma operadora que atendesse a uma criança que estava há dois dias em uma maca num hospital de urgência e emergência do plano, à espera de leito para ser internada. Esse é um caso clássico da falta de infra-estrutura dos planos de saúde”, conta.    
Para o presidente da Unimed Belém, Cesar Neves, quando as tutelas antecipadas referem-se a casos de urgência e emergência, não há o que se discutir. “Mas a Justiça está determinando tutela antecipada para situações eletivas. Outro dia, a Unimed Belém teve de pagar mais de 80 mil reais para a realização de uma inseminação artificial, num prazo de 48h, por determinação de tutela antecipada. É pra isso que serve esse dispositivo? Onde está o pensamento no interesse público?”, provoca o presidente.    
José Roberto Cardoso Murisset, diretor de Relações Intersindicais da Fenam, afirma que, apesar desses problemas, o SUS é a solução para a saúde do brasileiro. “A judicialização da saúde é o meio que a sociedade encontrou para cobrar os seus direitos, tanto na esfera pública quanto na saúde suplementar. O pensamento que deve prevalecer é o interesse público. Por isso, essa discussão entre as esferas é necessária, para que se chegue a um consenso ou, pelo menos, que cada um conheça um pouco das especificidades que cada instituição”, finalizou o dirigente.
     
Fonte: Imprensa Sindimepa - 20-06-2008


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