O inverno deve mobilizar a atenção dos pais de recém-nascidos. É no momento em que o frio obriga as pessoas a fechar janelas e portas que o pneumococo encontra um ambiente propício para sair de um organismo e invadir outro - a via respiratória é a freeway da bactéria.
Foi identificado, pelo estudo PAE Brasil - Pneumococo: Avaliação Econômica Brasil, um avanço da meningite pneumocócica em todo o país na população com menos de um ano. Esse resultado serve para acentuar a necessidade de cuidados, como manter o ambiente arejado e não fazer pouco caso de febres aparentemente inexplicáveis no bebê.
Os registros do Ministério da Saúde mostram que ela se equiparou à meningocócica, até então considerada a meningite mais comum, segundo os últimos dados disponíveis no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), do Ministério da Saúde. Esse sistema é alimentado, principalmente, pela notificação e pela investigação das doenças que constam da lista nacional das enfermidades que devem ser relatados pelos hospitais aos órgãos de saúde pública. A meningite está entre essas doenças.
- A doença meningocócica em vários estados vem diminuindo, enquanto a pneumocócica segue estável em algumas regiões e está aumentando em outras - afirma Eitan Berezin, presidente do Comitê de Infectologia da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP).
Berezin adverte que o número pode ser até maior porque, muitas vezes, o diagnóstico é feito apenas pela identificação dos sintomas, sem exames laboratoriais. Isso pode esconder outros casos da pneumocócica.
- Podemos explicar essa queda da meningocócica porque o Brasil atuou forte para bloquear esse tipo de bactéria, que geralmente ataca em surtos, com muitos casos concentrados em um local, às vezes em uma creche ou escola. Mas o Streptococcus pneumoniae raramente ocorre em surtos, ele mantém uma estabilidade - diz a médica neonatologista Jessica Presa, pediatra especializada em recém-nascidos e gerente médica da Unidade de Vacinas da Wyeth.
Ela esclarece que, por não poderem dizer o que estão sentindo, os bebês precisam ser monitorados permanentemente. A bactéria pode estar em qualquer lugar e não está necessariamente associada à classe social da família.
Considerar que uma boa condição de vida é o bastante para afastar o risco pode levar a um diagnóstico tardio.
Pneumococo causa a morte de 3,3 mil crianças por ano
Infelizmente, essa é uma realidade constatada no PAE Brasil. A bactéria pneumococo provoca mais de 260 mil casos novos de doenças e 3,3 mil mortes de crianças todos os anos no país tanto por meningite quanto por pneumonia.
Também fez parte do trabalho mostrar que essas situações poderiam ser evitadas, a médio e longo prazo, com o uso da chamada vacina conjugada 7-valente, produzida pela Wyeth e recomendada pela SBP e pela Sociedade Brasileira de Imunizações. Por enquanto, existe apenas na rede privada, por cerca de R$ 200 cada dose.
O valor do repasse que seria necessário aos hospitais para bancar o tratamento de um doente pode apressar a inclusão da vacina no calendário do Sistema Único de Saúde (SUS) para todos os menores de cinco anos, e não somente para aqueles que nascem com necessidades especiais, como ocorre hoje. A vacinação pode reduzir as internações, acreditam especialistas.
Uma instituição pública, segundo o infectologista e pediatra Otávio Cintra, do Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto (SP), gasta até 12 vezes mais do que é repassado pelo SUS com cada doente.
A análise do especialista revelou que o tratamento completo de uma criança internada com pneumonia pneumocócica custa para o hospital, em média, R$ 6 mil. O pacote pago pelo SUS para o mesmo tratamento, com medicação diária de cinco dias de internação, é de R$ 554.
- Esses resultados podem ser estendidos para hospitais públicos de todo o país. O Ministério da Saúde já reconheceu essa discrepância. A vacinação, quando adotada, poderá reduzir em até 70% o número de internações - avalia Cintra.
Perigo nos primeiros anos
Bactéria que causa pneumonia é também a maior responsável pela meningite entre as crianças de até um ano
Uma das doenças mais graves que podem atingir crianças com menos de um ano, a meningite - infecção da membrana que cobre e protege o cérebro e a medula - não pode ser associada exclusivamente ao meningococo, a bactéria mais comum nesse tipo de infecção. Outro microorganismo, o pneumococo, tem freqüência parecida e é mais perigoso, quando se fala em seqüelas e causa de mortes.
Ele está presente no ar e pode até conviver com uma família sem provocar qualquer mal. Mas, ao constatarem febre e irritabilidade persistente em um bebê, por exemplo, os pais precisam ficar atentos. O pneumococo não provoca os mesmos sinais, como manchas na pele, que o meningococo. A vacina ainda não é fornecida pelo Ministério da Saúde, e quem quiser fazê-la só a encontrará na rede particular.
Esse alerta permeou o estudo PAE Brasil - Pneumococo: Avaliação Econômica, divulgado na semana passada em São Paulo. Fruto do trabalho de oito pesquisadores e consultores de universidades e entidades médicas, patrocinada pela indústria farmacêutica Wyeth, a pesquisa lançou luz sobre um agente causador de doenças que inquieta pediatras.
- Em termos de letalidade e seqüelas, o pneumococo é responsável por uma meningite pior do que a causada pelo meningococo. Ele é mais tóxico para o sistema nervoso central e pode ter um diagnóstico mais demorado, o que é perigoso - alerta Eitan Berezin, presidente do Comitê de Infectologia da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP).
Segundo ele, a bactéria predomina nas meningites em crianças menores de um ano, quando os sintomas são mais difíceis de serem avaliados. Também causadora da pneumonia, ela está presente no ar e se aloja no nariz e na garganta de qualquer pessoa. Muitos podem ter colônias dessa bactéria no organismo sem desenvolver qualquer doença.
Mas quando ela rompe a barreira da mucosa nasal e atinge a corrente sangüínea, a preocupação começa. Pode causar febre por algumas horas e chegar aos pulmões e à meninge.
Por ter contato pela primeira vez com o Streptococcus pneumoniae, os bebês ainda não têm anticorpos para combatê-lo. Na maioria das vezes, o resultado dessa presença no sangue é febre intermitente por algumas horas. Muitas vezes, os médicos nem chegam a identificar a causa da febre, que desaparece sem explicação.
Mas ficar apenas no sangue é o menor mal que pode ocorrer. A preferência do pneumococo é se multiplicar no pulmão e na meninge. Alojada no local, começa um processo de multiplicação agressivo. O organismo responde ao ataque e origina uma inflamação que incha e produz muito pus junto ao cérebro. Esses efeitos podem provocar lesões permanentes nos bebês, como dificuldade de aprendizagem e surdez.
A preocupação especificamente com a incidência do problema entre crianças pequenas e as suas conseqüências não é exagerada. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), as doenças pneumocócicas, entre elas a meningite e a pneumonia, são as primeiras razões de morte em crianças menores de cinco anos, entre os males que poderiam ser prevenidos com vacinação.
No Brasil, está em estudo a inclusão da vacina no calendário do Ministério da Saúde.
Por enquanto, têm acesso gratuito a essa imunização somente crianças com necessidades especiais, como bebês prematuros, portadores de Síndrome de Down, entre outras condições que fragilizam o sistema imunológico. Os demais somente por meio da rede privada.
* O repórter viajou a convite do laboratório farmacêutico Wyeth
Mais conhecido como pneumococo, o Streptococcus pneumoniae é responsável por doenças letais como pneumonia e meningite pneumocócica, além de otites que podem causar surdez, entre outras doenças graves. Doenças pneumocócicas matam 1,6 milhão de pessoas por ano, 90% delas nos países em desenvolvimento.
Na América Latina
Duas crianças morrem por hora
A cada ano, 1,6 milhão de pessoas desenvolvem doenças causadas pela bactéria
No Brasil
750 mil pessoas foram internadas por pneumonia em 2005, das quais 40% causadas por pneumococo, segundo estimativas
É a principal causa de morte por pneumonia e meningite bacterianas em crianças abaixo de cinco anos
Sintomas da meningite pneumocócica em todas as idades
Dor de cabeça alta
Febre alta e vômitos
Rigidez da nuca
Sintomas em bebês
Em crianças até dois anos, podem se restringir à febre e irritabilidade
Tratamento
Deve ser específico para o agente causador
No caso de meningites virais não existe um tratamento específico, elas tendem a ser infecções menos graves e que terminam após o ciclo do vírus
Para as infecções bacterianas, o tratamento deve ser o mais rápido possível, sendo empregado o antibiótico determinado pelo médico
Outras doenças do pneumococo
Pneumonia: infecção dos pulmões que provoca tosse, febre, calafrios, falta de ar ou respiração rápida
Bacteremia: presença de bactérias na corrente sangüínea, podendo evoluir para a sepses (infecção generalizada muito grave). Em crianças novas, pode dar apenas febre
Otite média aguda: infecção do ouvido médio que causa dor local, agitação, febre e inflamação da membrana do tímpano
Sinusite: infecção dos seios da face com os sintomas dor de cabeça, febre e tosse, principalmente à noite
Fonte: Diário Catarinense - 07-07-2008